Traumas psicológicos: Psicoterapias corporais desenvolveram uma metodologia consistente para lidar com os sintomas, tais como: ansiedade, isolamento social, fobias e transtornos psicossomáticos. Visto que pesquisas em neuropsicologia têm comprovado mudanças cerebrais e psicofisiológicas nocivas decorrentes de eventos traumáticos. Dessa forma, a técnica de grounding, respiração e trabalho com o músculo psoas, que costuma sofrer contração crônica após o choque traumático e o colapso da resposta natural do organismo ao estresse. Pretendemos demonstrar exercícios e técnicas que podem ser utilizados em diferentes fases do tratamento de pacientes traumatizados. Visando resgatar a pulsação bloqueada pela hiperexcitação do sistema nervoso e construir recursos de resiliência para a superação dos traumas psicológicos.
Esse texto visa apresentar as bases teóricas principais da vivência a ser apresentada no Congresso, que tratará do tratamento bioenergético do Transtorno de Estresse Pós Traumático e de sintomas decorrentes de traumas ou choques. Para essa finalidade, podemos inicialmente citar BOGGIO (2008), autor que estabelece três fases importantes para o tratamento do TEPT no enfoque da psicologia corporal, as quais requerem do terapeuta diferentes habilidades e competências relacionais, sendo discutidas com a contribuição de outros autores pesquisados. As fases aqui descritas não acontecem sequencialmente em uma ordem rígida, podendo em uma sessão surgir aspectos de várias dessas etapas que devem ser tratados conforme a evolução e demanda específicas de cada paciente. A vivência propiciará aos participantes vivenciar cada uma delas, que são:
1. Estabelecimento de um vínculo seguro que garanta a contenção, estabilização e educação sobre os sintomas
Nesse momento do processo, logo após ser realizado um diagnóstico cuidadoso do quadro de TEPT, o principal foco de trabalho consiste no estabelecimento de um clima de confiança e vínculo seguro entre terapeuta e paciente. FINLAY (2007) define esse processo de vínculo como “habitação” (indwelling), ou seja, o processo de acolhimento e postura empática do terapeuta para com as demandas e sensações do paciente sem muitas intervenções. Através da relação com o terapeuta, o paciente adquire gradualmente a capacidade de focar sua atenção nas suas sensações corporais, nomeando as angústias/emoções inicialmente difusas e hiperativadas, para manejar o impacto energético advindo das lembranças associadas aos eventos traumáticos. Para atingir esse fim, é importantíssimo o atentar para o tripé terapêutico apontado por BOADELLA (2007): o centramento (centering) focado no trabalho com a respiração que propicia uma maior atenção às emoções e propriedades relaxantes; o enraizamento (grounding) para propiciar uma sensação de segurança corporal a partir de exercícios realizados sentindo os suportes somáticos (pernas, costas, braços); e o contato ocular (facing) com o terapeuta, propiciando a comunicação de pensamentos e sentimentos numa conexão com o outro. Outro ponto a ser trabalhado nessa fase refere-se à construção de limites, já que o trauma consiste em um evento que invadiu a dinâmica psicossomática do paciente e deixou-o impossibilitado de reagir. Isso pode ser trabalhado a partir do exercício de distância física que pode ser experimentada na relação intersubjetiva com o terapeuta, na qual o paciente pode propor, a cada sessão, que o terapeuta possa aproximar-se ou afastar-se de acordo com seu estado subjetivo no momento. O trabalho de conscientização e expansão dos micromovimentos (RESNECK-SENNES, 2004; ECKBERG, 1999), também suscita o desencadeamento de respostas de fuga/luta como chutes, socos, empurrões, os quais devem ser associados à expressão vocal, via sons, gritos ou consígnias como “sai”, “não”, etc. O princípio de “dosificação” criado por LEVINE (2004) serve como uma cautela que o terapeuta deve seguir para propor esses procedimentos, isto é, como na química, a experiência emocional deve ser modulada de tal forma que desprenda a energia congelada pelo trauma sem, no entanto, ocasionar uma explosão catártica retraumatizadora. A educação sobre os sintomas do TEPT também deve ser alvo das ações terapêuticas, pois tanto a superexcitação como o congelamento do sistema nervoso faz com que os pacientes interpretem os sintomas como corpos estranhos, intrusivos e ameaçadores, geralmente associados com emoções de medo de enlouquecer ou morrer (LOWEN, 1995; LEWIS, 2000). Dessa maneira, uma atitude de contenção das intensidades emocionais do paciente deve servir como um marco cognitivo de desidentificação das experiências negativas que ficaram no passado e que não vão retornar no presente momento (aqui/agora) da sessão. FINLAY (2008) argumenta que esse objetivo é possível quando o terapeuta usa uma medida certa entre compreensão empática e confrontação, entre toque e interpretação, para não infantilizar o paciente e garantir a ele o desenvolvimento/reestabelecimento de seus recursos internos para desintensificar os sintomas que desestruturam seu senso de autorregulação.
2. Integração do Self por meio da renegociação, rememorização e reorganização do material traumático
Após a fase inicial de construção de suportes internos para compreender e manejar os sintomas advindos dos traumas psicológicos, a tarefa terapêutica nesse momento centrase na conscientização e elaboração das memórias traumáticas. Esse processo implica uma corporificação dos efeitos do trauma, através do método de educação somática proposto por KELEMAN (1998, 1995), que tenta compreender como o corpo responde ao estresse por mudanças formativas, isto é, os tecidos transformam-se para adaptar-se à situação ameaçadora via contração, inchaço, congelamento, adensamento, colapso. Na terapia, o paciente é convidado a entrar em contato, a partir do relato de suas memórias traumáticas, com as reações corporais que surgem – uma tensão nos ombros, uma respiração presa, uma falta de energia nas pernas, uma sensação de aperto na garganta ou no peito, por exemplo. O terapeuta, a partir disso, convida o paciente a exagerar essas reações somáticas, para intensificar o desencadeamento emocional e o processo de atribuição cognitiva do sentido, para posteriormente solicitar que o paciente possa gradativamente desmanchar o padrão intensificado de resposta. A intenção terapêutica consiste em dar condições ao paciente de controlar conscientemente a modulação do padrão hiperativado de resposta ao evento traumático, educando-o para a possibilidade de novas respostas a partir das mudanças psicossomáticas vividas com o desmanchar do padrão intensificado.
Outro conceito importante elaborado por KELEMAN (1996) é o de middle ground, que significa o momento da transição, um tempo necessário entre o trabalho de mobilização terapêutica/emocional e a possível transformação do padrão e da forma psicossomáticos. Consiste no silêncio, no espaço potencial em que as emoções decorrentes dos traumas psicológicos podem ser contidas, suportadas e corporificadas. Esse processo pode ser definido como o espaço da presentificação da angústia, da incerteza sobre como superar os sintomas e realizar algo novo, para que a criatividade possa despontar e nascer. Assim, a tarefa do terapeuta é propiciar a conscientização e fortalecimento psicossomático desse organismo que se fragmentou com o distresse decorrente do evento traumático (expressos por afrouxamento da forma dos tecidos, colapso das funções orgânicas e cognitivas, baixa energia e metabolismo) para dar condições ao ego de regular as emoções e criar novas possibilidades de viver. FINLAY (2007), BOGGIO (2008) e BERCELI (2003) acreditam que é possível, a partir do estabelecimento de um vínculo seguro, propor exercícios e técnicas vivenciais mais ativos ao paciente, para potencializar a corrente de vibrações involuntárias em todo o corpo, considerada sinal de descongelamento da energia paralisada na musculatura e uma condição indispensável para a cura psicossomática dos traumas psicológicos. Os procedimentos incluem: a) técnicas de mobilização da tensão ocular (pois os olhos ficam tensionados de medo, expressando uma fixação na memória visual do evento traumático); b) massagens na face e nuca (para dissolver a tensão na cabeça, resultante do choque encefálico); c) exercícios bioenergéticos de grounding e alongamento para estimular a vibração no músculo psoas que, de acordo com BERCELI (2008), está envolvido com as respostas instintivas de fuga/luta; d) procedimentos de desbloqueio dos anéis de couraça, principalmente o torácico e o diafragmático, via movimentos expressivos e massagens. FINLAY (2007) alerta para a sensibilidade do terapeuta em propor os procedimentos citados em momentos que possam fazer sentido no processo terapêutico, obedecendo sempre a observação do padrão emocional do paciente no decorrer da sessão. Os trabalhos não devem ser realizados de maneira mecânica ou forçados, pois muitas vezes, o paciente realiza os exercícios de maneira mecânica e sem sentido, somente para agradar ao terapeuta, propiciando o fenômeno, citado no texto de FINLAY (2008), da Síndrome de Estocolmo, ou seja, o reedição de um vínculo abusivo com o agressor na relação transferencial.
Com esses procedimentos, o propósito central volta-se para o desenvolvimento de um vórtice curativo (como definido por LEVINE, 2004) que, através de experiências e memórias reparadoras propiciadas no decorrer das sessões, possa dar condições ao paciente de negociar cognitiva e emocionalmente com os sintomas negativos resultantes do TEPT. Surge, em decorrência, uma maior sensação de auto-confiança, além de uma avaliação positiva dos recursos de enfrentamento de futuros eventos estressores, uma maior segurança interna e atitudes positivas frente a vida.
2. Restabelecimento da capacidade de expansão e prazer na vida cotidiana
Na última etapa do tratamento, a principal meta é recuperar o poder do paciente de viver seu cotidiano com prazer, integrando seu potencial expansivo e estimulando projetos. BOGGIO (2008) relata que o estado inicial de hiperativação simpaticotônica decorrente do TEPT inviabiliza a experiência de prazer, e sentir-se capaz de estabelecer um relacionamento afetivo gratificante e realizar uma atividade laboral com identificação e prazer. Para isso, cabe ao terapeuta ajudar o paciente a desinvestir do papel de vítima ou sobrevivente dos traumas psicológicos, no qual esteve identificado e teve ganhos secundários para dar lugar a um posicionamento pró-ativo em direção a responsabilidade pelas mudanças em sua vida e nos relacionamentos. Tal atitude torna-se viável, segundo LEWIS (2000) e FINLAY (2007), quando o terapeuta reforça a auto-valorização positiva e o aprendizado que o paciente obteve tanto ao vivenciar a situação traumática, quanto ao tratá-la através da psicoterapia. É incentivada a postura de auto-defesa e fortalecimento dos limites egóicos, ao mesmo tempo em que é estimulada uma maior abertura para novas conexões com as pessoas e expansão de interesses e projetos de vida.
Ou seja, falando numa linguagem bioenergética, reestabelecer a capacidade pulsatória entre contração (estando consigo mesmo, numa capacidade avaliativa e reflexiva) e expansão (ir à busca do outro, do ambiente para satisfazer as suas necessidades, estar em relação). Dessa forma, BOGGIO (2008) discorre sobre a importância de recuperar o potencial de sexualidade do paciente, fechando o ciclo de descarga energética para a pélvis, considerada por REICH (1992) como potencial de saúde. Para isso, os exercícios clássicos de bioenergética propostos por LOWEN (1995), tais como stool, todas as formas de grounding, exercícios de mobilização pélvica, são indicados.
Por: Périsson Dantas do Nascimento e Eugenice Paula de Moura
Fonte: https://www.centroreichiano.com.br/artigos/Anais-2010/NASCIMENTO-P-MOURA-Eugenice-Construindo-a-resiliencia.pdf